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Crítica | Regras do Amor na Cidade Grande – Quando ser você mesmo é o maior ato de rebeldia

Em um mundo cada vez mais conectado, onde fronteiras culturais se tornam borradas por telas e cliques, é curioso perceber como jovens de países distantes começam a se vestir, falar e até sonhar de formas parecidas. A globalização não apenas encurtou distâncias, ela aproximou corações.

A produção mergulha nas relações atuais, mostrando como o amor pode florescer ou se complicar entre arranha-céus, apps de mensagem e cafés lotados. Mas, por trás da estética urbana e dos conflitos modernos, está o que realmente nos une: a vontade de encontrar alguém que nos entenda.

Dois Mundos, Uma Frequência

Ele preferia o silêncio das palavras escritas ao barulho do mundo. Estudante de francês, tímido, contido, Heung-soo(Steve Sanghyun Noh) levava a vida com passos calculados e sonhos sussurrados. Até que, como um vendaval colorido numa sala em tons de cinza, entrou Jae-hee (Kim Go-eun), intensa, espontânea, impossível de ignorar.

Ela ria alto, dançava sem pedir licença e parecia viver em um mundo onde julgamentos não tinham espaço. Ele, acostumado a esconder partes de si, encontrou nela um lugar seguro. Entre livros, cafés e noites coreanas iluminadas por néons, nasceu uma amizade que parecia improvável, e por isso mesmo, tão forte.

Heung-soo e Jae-hee se chamam de “marido e esposa”, mas o que os une vai muito além do que cabe nesse rótulo. Quinze anos antes, ele era um estudante gay tentando se esconder; ela, uma jovem que recusava qualquer filtro social. Um beijo secreto, uma amizade inesperada, escândalos na faculdade e a coragem de ser quem se é, mesmo quando o mundo prefere que não. Juntos, enfrentaram o que é ser jovem em uma sociedade que cobra rótulos e obedece regras. Mas eles preferiram criar as próprias regras.

Mas Regras do Amor na Cidade Grande não é apenas sobre encontros. É sobre pertencimento. Sobre duas almas fora do molde tentando entender o que significa existir em uma sociedade que insiste em classificá-las. Jae-hee, dona de si. Heung-soo, um cara gay, buscando coragem para ser quem é.

Juntos, eles provam que, às vezes, a conexão mais poderosa não nasce do romance, mas do reconhecimento silencioso entre dois corações que, apesar de tudo, batem na mesma frequência.

O Reencontro e a Redefinição do Amor

No final, anos depois, o reencontro entre Jae-hee e Heung-soo é como um abraço silencioso do passado. Ela, prestes a se casar, ele, com o peso das mudanças e a leveza das memórias. Juntos, revivem os momentos que moldaram a amizade que desafia o tempo.

Mas o momento que mais toca é quando Heung-soo, em um gesto inesperado, canta Bad Girl Good Girl do miss A, mergulhando todos nós em um mar de nostalgia e emoção. É um lembrete de que, apesar das transformações, algo essencial permanece: o vínculo que eles construíram.

E como se fosse o último pedaço de uma jornada, Heung-soo também encontra um tipo de aceitação que parecia distante, quando sua mãe, assistindo Me Chame Pelo Seu Nome, finalmente entende o filho como ele é. Nesse instante, talvez possamos acreditar que sim, existe um tipo de final feliz, não perfeito, mas finalmente inteiro.

Mais do que um romance: um retrato cru da juventude urbana

Não se engane pelo título ou pelas primeiras cenas: Regras do Amor na Cidade Grande não é só mais uma história sobre jovens apaixonados tentando se encontrar. É um espelho, por vezes desconfortável, da geração que vive entre a liberdade prometida e os limites impostos.

O filme começa com uma sensação familiar: a de não pertencer. Mas logo mergulha em águas mais profundas, onde o amor, a amizade e a identidade colidem com as expectativas de uma sociedade que ainda decide quem pode ser livre, quem deve se calar, e o que é “normal” amar.

A narrativa expõe sem suavidade as pequenas e grandes violências do cotidiano: o olhar torto, a pergunta invasiva, a solidão de quem não se encaixa nas caixinhas sociais. Enquanto acompanhamos os protagonistas em suas jornadas individuais, o filme desmonta, com sutileza e coragem, os filtros que ainda distorcem as relações humanas.

Regras do Amor na Cidade Grande é sobre sentir demais num mundo que sente de menos. Sobre rir, dançar, esconder, resistir, e acima de tudo, existir.

Um filme que pulsa como a vida

Regras do Amor na Cidade Grande não apenas retrata uma história, ele faz com que a gente viva junto dela. Cada detalhe, da trilha à maquiagem, vibra em harmonia com a jornada dos protagonistas. Ao longo de duas horas que passam como um sopro, percorremos quase duas décadas de descobertas, afetos e rupturas. Quando os créditos sobem, a sensação é íntima: como se dois velhos amigos tivessem acabado de abrir o coração diante de nós.

É mais do que um retrato da juventude coreana, é um espelho para sentimentos que qualquer um, em qualquer canto do planeta, pode reconhecer. Porque, no fim, apesar de culturas distintas, o amor ainda fala a mesma língua.

NOTA | 5/5

Título Original: Love in The Big City
Direção: E.oni
Roteiro: Park Sang-young
Elenco: Kim Go-eun, Steve Sanghyun Noh, Salim Benoit

Coreia do Sul | 2024 

118 min. 

Comédia-Romântica

Distribuição: A2 Filmes

Trailer

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