
Brasil emociona Cannes com cultura, cinema e frevo na estreia de ‘O Agente Secreto‘
Foi sob aplausos, música e emoção que o Brasil fez história neste domingo (18) na Riviera Francesa. A estreia mundial de O Agente Secreto, novo longa de Kleber Mendonça Filho, transformou o 78º Festival de Cannes em palco para o talento, a força e a identidade do audiovisual brasileiro. O filme, estrelado por Wagner Moura e coproduzido com Alemanha, Holanda e França, disputa a cobiçada Palma de Ouro, e deixou sua marca com uma exibição ovacionada por quase 15 minutos.
Antes mesmo do escurecer da sala, o Brasil já havia conquistado o festival: a equipe do filme chegou à Croisette acompanhada de uma orquestra de frevo pernambucano, rompendo o protocolo com ritmo, cor e alegria. Foi mais que uma entrada, foi uma afirmação cultural. O desfile contou com os atores Gabriel Leone, Maria Fernanda Cândido, Juliana Paes, Bárbara Paz, Isabel Zuaa e o estreante Caio Venâncio, ao lado da produtora Emilie Lesclaux e do diretor Kleber Mendonça Filho.
A presença brasileira também foi política e estratégica. A ministra da Cultura, Margareth Menezes, e a secretária do Audiovisual, Joelma Gonzaga, integraram a comitiva e celebraram o momento como um divisor de águas. O filme, viabilizado com recursos do Fundo Setorial do Audiovisual (FSA), é símbolo de um país que aposta no cinema como potência criativa e econômica.
Para a ministra, a escolha do Brasil como país de honra no Marché du Film amplia horizontes:
“É uma janela de oportunidades que reposiciona nossa produção no cenário global. Estamos com o coração batendo forte, felizes, aplaudindo de pé a cinematografia nacional. Este é um novo tempo para o audiovisual brasileiro.”
Em meio ao prestígio e à celebração no Festival de Cannes, o diretor Kleber Mendonça Filho refletiu sobre o valor de se fazer arte com raízes profundas no coletivo. Para ele, a cultura é um reflexo da identidade de uma nação, e o Brasil, com sua pluralidade vibrante, tem na arte um de seus traços mais marcantes.
“Quando um país permite que sua cultura se manifeste, ele revela quem é”, disse o cineasta. “O Brasil tem uma vocação cultural única, reconhecida mundo afora, seja pela música, pela literatura, pelo cinema ou pelas artes visuais. É um orgulho enorme ver O Agente Secreto ganhar vida com o apoio de políticas públicas, não só do Brasil, mas também da França, Alemanha e Holanda. É um filme que carrega essa força coletiva.”
Do outro lado do tapete vermelho, Caio Venâncio, jovem ator estreante no papel de Vilmar, o Matador, também viveu um momento marcante. Vindo de Natal, no Rio Grande do Norte, ele fez sua estreia internacional em grande estilo. “É minha primeira vez em Cannes, e é muito especial estar aqui representando a minha terra. O apoio do Ministério da Cultura torna tudo isso possível. Agora, eu também faço parte desse universo, e isso muda tudo”, disse, emocionado.
Entre aplausos e passos no tapete vermelho, ficou claro: O Agente Secreto é mais do que um filme, é um testemunho de que quando o Brasil investe em sua cultura, o mundo inteiro escuta.
O Brasil em muitas vozes: conferência em Cannes revela riqueza e diversidade do audiovisual nacional
Na tarde de domingo, do dia 15 de maio, o Brasil levou ao Festival de Cannes mais do que filmes, levou a pluralidade de seu fazer cinematográfico. A conferência “Com quem (co)produzir no Brasil?” reuniu profissionais de diferentes partes do país em um encontro que abriu ao mercado internacional as inúmeras possibilidades de colaboração com o audiovisual brasileiro.
Mais do que apresentar empresas, o painel desenhou um retrato do Brasil como território múltiplo. O produtor Marco Altberg resumiu bem esse espírito: “O Brasil é feito de muitos Brasis. Cada região carrega suas histórias, culturas, paisagens e formas de ver o mundo. Essa diversidade é um trunfo, e é exatamente o que o cinema mundial procura.”
A conversa contou com representantes de distintas iniciativas e territórios: Marco Altberg (Indiana Produções/BRAVI), Keyti Souza (Têm Dendê Produções/APAN), Juliana Soares (Destemida Filmes/API), Eva Pereira (Cunhã Porã Filmes/CONNE) e Luiz Alberto Rodrigues (Fundacine/FAMES). A mediação ficou por conta de Morris Kachani, do SIAESP/Cinema do Brasil.
O painel reforçou um ponto central: coproduzir com o Brasil é mais do que um investimento, é uma chance de acessar narrativas únicas, contadas por quem vive e transforma o país em suas mais variadas dimensões.
O cinema que pulsa da maioria: vozes negras reivindicam espaço, narrativa e poder em Cannes
No mesmo domingo em que o Brasil foi celebrado nos corredores de Cannes, um outro tipo de protagonismo tomou forma em um espaço de escuta e afirmação. O painel “Vozes da Maioria no Cinema: Os 54% Negros do Brasil Não Podem Esperar” reuniu artistas, produtores e ativistas comprometidos com uma transformação urgente: fazer do audiovisual brasileiro um reflexo verdadeiro da população que o compõe.
Com uma fala carregada de potência e memória, a atriz e produtora Camila Pitanga, embaixadora da ONU Mulheres, evocou nomes que moldam a história negra no Brasil, “Eu quero o Brasil do Luiz Gama, da Carolina Maria de Jesus. Mais Antônios, Pitangas, Benedita da Silva. Nós existimos. É esse o cinema brasileiro que eu quero ver”, lembrando que representatividade não é uma questão de tendência, mas de justiça histórica.
Ao lado dela, dividiram o espaço Robson Dias (Búzios Films), Bethânia Maia (Vaporosa Cultural) e Pedro Santiago (compositor), em uma conversa mediada por Markus Thersio, do Instituto Nicho 54. O debate foi realizado em parceria com o Instituto Guimarães Rosa, ONU Mulheres e Projeto Paradiso.
Mais do que denúncia, o encontro foi afirmação e estratégia: reforçou-se a necessidade de políticas públicas robustas, linhas de financiamento inclusivas e uma cadeia produtiva que abra espaço para criadores negros em todas as etapas do processo da ideia ao set, da distribuição à curadoria.
Porque os 54% Negros do Brasil. não podem mais esperar para ver suas histórias contadas com dignidade, centralidade e força nas telas do mundo.
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